25 maio 2010

Despedida de Solteira


Cefas Carvalho

Surpreendi-me com o telefonema dela. Havia muito tempo (um ano?) que não me telefonava. Clarissa era sempre surpreendente. Primeiro conversou banalidades, perguntou sobre a vida, a esposa, os filhos, estas coisas... depois adentrou o terreno da malícia – território na qual ela tinha total domínio – relembrando histórias picantes do passado... Por fim, comunicou que iria se casar no mês seguinte. Desejei felicidades, ainda estranhando a conversa e ela comunicou que mandaria convites e fazia questão que eu e minha esposa Raíssa estivéssemos presentes no casamento. “Mas não é para isso que estou telefonando...”, comentou. “E qual a razão do telefonema?”, perguntei. “É que eu pretendo fazer uma despedida de solteira e gostaria de te convidar...”, sussurrou. “Pensei que as despedidas de solteira só envolvessem mulher”, retruquei. “Esta despedida de solteira é especial. Não haverá mulheres, apenas eu”. “Vai convidar apenas homens?”, ri. “Eu não disse isso... o único homem convidado é você...”, respondeu. Compreendi imediatamente. Entrei no jogo de Clarissa e combinamos então o dia, a hora e o local da tal despedida de solteira.
Na quarta-feira ao meio dia, “para evitar suspeitas, afinal, você é casado e eu sou uma noiva fiel e respeitadora...”, riu, debochando de si mesma e da situação. Clarissa continua louca!, Pensei. Mas, e daí? Eu não havia me apaixonado por ela no passado justamente por que era louca? Bem, confesso que esperei com apreensão a quarta-feira, que enfim chegou. Ela ligou para meu celular às onze confirmando tudo e marcou o encontro em um posto de gasolina na BR-101, já em Parnamirim. Lá, ela deixou o carro estacionado discretamente e entrou no meu. Discutimos rapidamente para qual motel iríamos e logo fechamos por um de qualidade que fosse discreto e nas proximidades. Na suíte, percebi logo que o tempo só havia melhorado Clarissa, como um vinho que eu iria começar a degustar. Não estou falando de seu corpo – ainda belo mas com as inevitáveis marcas do tempo e da gravidade – nem de seu rosto – não havia maquiagem que escondessem algumas rugas e um olhar cansado antes impensável – mas de sua personalidade e de seu modus operandi. Os olhos brilhantes, imensos, acastanhados, continuavam insanos... suas mãos estavam ainda mais hábeis, assim como seus lábios... seu corpo correspondia ainda mais ao meu corpo do que antes, como se no máximo de seu potencial. Comentei tudo isso com Clarissa durante o ato... “Você ainda não viu nada...”, sorriu, desvairada. Dito e feito. Eu ainda veria – e sentiria – muito mais coisas nas quatros horas que se seguiram, de um deleite que poucos vezes havia experimentado na minha vida já de tantos prazeres. Às quatro e quinze da tarde começamos a nos arrumar, pois que ela havia marcado com o noivo no Praia Shopping às cinco horas. Deixei-a no posto de gasolina e sem maiores delongas nos despedimos pragmaticamente. “Te vejo no meu casamento”, disparou. Não tivemos oportunidade de conversar sobre isso, mas comecei a me perguntar porque ela iria se casar e o que ela esperava do seu casamento. Tolice. Por que analisar as coisas se é melhor apenas vive-las e pronto? Desta forma, voltei à minha vida, a Raíssa e esqueci-me de Clarissa e de nossa tarde de idílio. Recebi em casa o convite de casamento, mas inventei um trabalho qualquer para não ter que ir. Tampouco Clarissa entrou em contato comigo antes ou depois das núpcias.
O tempo passou. Diria até que havia esquecido a despedida de solteira da qual participei quando, dois anos depois, vejo no visor do celular um telefone estranho. Atendo e eis minha surpresa: era Clarissa. Começou falando banalidades como sempre. Por fim, perguntou como estava meu casamento (muito mal), minha vida profissional (razoável) e falou sobre ela própria... Não apenas estava em crise no casamento como muito próxima da separação... Relatou alguns dos problemas que estava vivendo, choramingou um pouco... Como eu estava prestes a entrar em uma tensa reunião de trabalho e não estava com muita paciência, perguntei logo o que queria. Clarissa então respirou fundo e disparou: “Na verdade, eu queria uma despedida de casada”. “Como assim”, estranhei. “Quero ter certeza que o melhor a fazer é me separar... e só vou ter essa certeza se for para cama com outro homem. Seria então minha despedida de casada...”, assinalou, já com voz mais lasciva do que triste. O que fazer? Bem, se eu participei da despedida de solteira dela, achei que seria uma descortesia não fazer parte da despedida de casada. “Pode marcar dia, hora e local”, respondi. “Lembra-se daquele posto de gasolina?...”

19 maio 2010

Como assistir filmes em 3D nos anos 80


Cefas Carvalho

Dia desses, conversando on line com minha irmã, a mitológica Rosa Williams, sobre experiências cinematográficas, lembrei com humor que fui pioneiro em assistir filmes em 3D ainda nos anos 80.
Espere aí, tecnologia 3D em uma década que ainda assistíamos filmes em VHS nos velhos e bons (mas nem sempre) videocassetes? Explico.
Ano de 1989. Combino com um amigo roqueiro (guitarrista da banda Facínoras, que marcou época na Zona Sul do Rio de Janeiro sem ter feito sequer um show...) assistirmos a “Tommy” no Cineclube Cândido Mendes. Claro, já havia assistido meia dúzia de vezes a ópera-rock do The Who, mas na telinha na TV. Expectativa em ver o delírio de Ken Russel na tela grande. Chegamos no Centro cultural uma hora antes de começar o filme. “Que tal uma cerveja?”, propôs Breno. Rumamos para um boteco próximo. Contudo, separada a grana para as entradas, constatamos nosso liseu. Cerveja? Melhor não. Pensamos na boa, velha e barata cachaça, mas nem eu nem o amigo éramos chegados à “mardita”. Foi quando ele avistou numa prateleira uma garrafa de Campari. Barata a dose, forte o efeito. Não contamos conversa. Por falar em conversa, eis que conversa vai, conversa vem, entornamos cada um sete doses de Campari. E estava quase na hora de começar o filme.
Cinema quase vazio, apagam-se às luzes e percebo, então, que uma tonteira começa a se apossar de mim. De repente, sem trailler, sem aviso nenhum, começa o filme. Luzes, montagem rápida, um avião em chamas, uma guitarra ensandecida. “It´s a boy, Mrs. Walker, it´s a boy”, canta a enfermeira.
Logo depois, quando termina a cena em que Ann Margaret e Oliver Reed cantam “Christmas”, sinto a cabeça mais pesada e os olhos mais sensíveis à luz. “Acho que estamos um pouco bêbados”, comentou Breno. A partir daí, assisti o filme em terceira dimensão, o 3D. Em “Gypsy Queen” parecia que Tina Turner estava cantando na minha frente. E Elton John em “Pinball Wizzard”, que se abrisse os braços corria o risco de acertar meu rosto? Como confessar que tentei me proteger quando chove champanhe do aparelho de TV? Tudo 3D puro! Claro que na cena final também tentei escalar as montanhas, só que quando acenderam as luzes eu e Breno olhamos um para o outro espantados com a experiência que tivemos. E uma leve vontade de vomitar, claro.
Mas, vive experiência parecida dois anos depois, quando da estréia de “The Doors”, de Oliver Stone, no Cineclube Estação Botafogo. Iniciado que era na obra de Jim Morrison, estava na expectativa que o filme abordasse a relação do roqueiro com xamanismo e drogas. Tendo marcado com dois amigos que não apareciam (na época celulares não existiam, crianças), resolvi tomar umas cervejas no bar ao lado da bilheteria. Eis que três cervejas depois vendo o dinheiro escassear, venci meus pruridos e pedi uma dose de cana. Depois mais duas. E lá fui eu sozinho assistir ao filme.
Novamente, meio grogue na sala de exibição e vivendo meu 3D particular. Particularmente na cena em que Morrison está no palco e delira com índios dançando á sua volta, quase levantei da cadeira para invocar Mr. Mojo. No fim das contas, boas lembranças de anos que não mais voltam. O único problema deste tipo de 3D era a ressaca no dia seguinte.

10 maio 2010

Exumando cadáveres


Cefas Carvalho

Pouco ou nada eu poderia reclamar da vida. Bem casado com Viviane, pai de dois filhos – Daniel e Jussara – e estabilizado no emprego, como gerente de uma concessionária de veículos, eu tinha virtualmente tudo que um homem poderia querer: uma mulher bonita, filhos saudáveis, um carro, uma moto, estava quitando minha casa e começando a adquirir uma casa de Praia em Tabatinga. De quebra, era ainda jovem – tinha 34 anos – e saudável, a ponto de jogar futebol religiosamente todos os sábados à noite e de quebra não fazer feio no squash. Enfim, eu não tinha o que reclamar da vida, repito.
Contudo, nem toda a felicidade do mundo consegue fazer um homem ficar quieto, e o demônio sempre à espreita da curiosidade acaba por atentar a qualquer um de nós. Não, que não se pense que estou falando de uma traição conjugal. Seria mentira dizer que fui totalmente fiel a Viviane em doze anos de namoro, noivado e casamento, mas tampouco nenhuma destas infidelidades passou de uma noite, com mulheres que mal soube o nome, gerando casos que jamais vieram à tona.
O problema começou quando comecei a usar o tempo ocioso no trabalho não mais na copa, bebendo cafezinho e discutindo futebol com os vendedores, mas sim à frente do computador, na minha sala. Respaldado pela privacidade e pela total confiança que os donos do negócio tinham em mim, comecei a usar este tempo livre para desestressar, como dizem hoje, jogando paciência.
Descobrindo a Internet, providenciei um e-mail para mim. Se no início ela me serviu para assuntos profissionais, logo comecei a me comunicar com amigos e conhecidos e não tardei a adentrar o universo dos bate papos virtuais, tão freqüentados por mulheres aparentemente interessantes. Não, ainda não foi aí que o diabo entrou em meus pensamentos. Contudo, a partir daquele momento, iniciei-me no mundo no MSN. Também nele nada fiz que não pudesse relatar à minha Viviane.
Todavia, um amigo convidou-me a entrar no Orkut. A princípio imaginei que explorar a tal comunidade virtual não me traria qualquer novidade, seria até mesmo tedioso. Ledo engano. Procurando comunidades em comum com pessoas que me eram caras, resgatei velhos amigos e amigas. Reencontrei colegas de trabalho cujo paradeiro que desconhecia havia anos. Viciei-me não em fazer novos amigos, mas procurar e reencontrar velhos conhecidos, enfim.
Em uma tarde monótona, véspera de feriado, eu me encontrava na frente do monitor, cansado do MSN e do Google, quando o diabo me soprou no ouvido o nome de uma antiga namorada de adolescência. Digitei o nome dela para procura no Orkut e eis que tive na minha frente o seu perfil, com foto. Gostei da brincadeira e repeti a operação com mais três ex-namoradas.
Foi quando ganhei coragem de procurar pelo perfil de Bruna, namorada durante um bom par de anos e que cheguei a ensaiar um noivado até que o conflito de nossas personalidades fortes nos levasse ao término do romance. Se digo romance, é porque nosso relacionamento foi marcado por nuances de amor e paixão. Juntos, fizemos viagens, planos, aventuras, realizamos fantasias...Durante algum tempo, mesmo quando já havia iniciado namoro com Viviane, acreditei, como tanta gente faz em relação a alguém, que Bruna, com seus longos cabelos castanhos, suas sardas, seu sorriso quase infernal, sua agitação, euforia e temperamento forte, tivesse sido o amor da minha vida.
Já casado com Viviane, descobri que ela também casara, com um microempresário do ramo de informática e fora morar no interior de Minas Gerais. Logo os amigos em comum perderam contato com ela e o cotidiano me fez com que ela fosse subtraída dos meus pensamentos mais constantes.
Portanto, foi com certa apreensão que iniciei a busca por ela no Orkut, torcendo, no íntimo, que não desse em nada. Pelo que lembro, ela não é chegada nestas coisas de tecnologia, pensei. Tolice. De repente, surgiu na minha frente uma foto dela, com os cabelos pintados de loiro, mas as mesmas sarda. Alguns anos mais velha – fato ratificado por algumas rugas – mas ainda linda e com os olhos em fogo. Li seu perfil. Muito do que estava escrito ali eu conhecia, seus gostos, suas paixões... O que me chamou a atenção foi seu estado civil: solteira. Teria ela se separado do marido? Resisti à tentação de entrar em contato durante alguns dias.
Contudo, em uma bela noite, em casa mesmo, com Viviane e as crianças em casa já dormindo, mandei uma mensagem para ela pelo Orkut. Não me interpretem mal...Fui formal, discreto, quase seco. Mandei lembranças, perguntei pelos filhos, e no final, despedi-me com um abraço. Que besteira, pensei, ela mal deve lembrar-se de mim lá em Minas.
Não era bem assim. No dia seguinte recebi a resposta dela. Dizia que jamais me esqueceram e que estava morando novamente em Natal, divorciada, havia alguns meses. Não tinha vontade de rever os antigos amigos, mas queria me encontrar.
Resolvi deixar o Orkut de lado e mandei uma mensagem para seu e-mail, mais privado. Contudo, eu continuava formal. A resposta de Bruna é que não o foi. Ela se lembrava de momentos ardentes do passado, fazia brincadeiras maliciosas... era a mesma de quinze anos atrás, enfim. Trocamos e-mails durante duas semanas até marcarmos um encontro no Praia Shopping. Abraçamos-nos, conversamos sobre nossas vidas, nossas famílias, ela riu dos cabelos brancos que insistiam em aparecer em meu couro cabeludo, bebemos chope... Ouvi seus desabafos sobre o casamento fracassado, a barra de cuidar dos filhos e de voltar a morar na casa da mãe... Pensei que neste ritmo ficaríamos bons amigos, como tantos ex-namorados o fazem.
Mas, quando estava no caminho natural para levá-la para casa – a Avenida Salgado Filho, já que ela morava em Petrópolis – Bruna murmurou que não queria ir para casa. Para onde quer ir então?, Perguntei tolamente. Para um lugar onde possamos ficar sozinhos e lembrar os velhos tempos, respondeu. Então, os hormônios, somados ao álcool e à memória, falaram mais alto e terminamos a noite na suíte Diamante do Motel Bahamas. Ela queria pernoitar e a muito custo consegui lembra-la que eu era casado e deveria não apenas voltar para casa em horário cabível, como satisfações á minha esposa. A contragosto, ela concordou em sairmos, sob minha jura que repetiríamos a dose. Concordei, claro. Quem não o faria?
Três dias depois repetimos a dose, desta vez iniciando o idílio às sete da noite. Ficamos desta vez no Romangarden, até meia noite. Preocupado, refleti o quanto aquela brincadeira era perigosa. Mas as delícias experimentadas com Bruna eram intensas demais para que eu tivesse forças para parar. Passamos a nos encontrar duas vezes por semana, tanto de tarde como de noite. Eu estava preocupado se Viviane não perceberia a situação, mas ela parecia não desconfiar de nada. Comecei a me sentir culpado, achava que deveria terminar o caso com Bruna, mas, repito, não conseguia parar. Minha vida com Viviane era maravilhosa, mas tranqüila, quase monótona. Com Bruna eu tinha sexo de primeiríssima qualidade, emoção, riscos e de quebra toda uma afinidade do passado.
Todavia, eu deveria ter previsto que Bruna não se contentaria com pouco. Ela queria mais. Passou a exigir mais tempo, mais atenção, mais presentes. No dia de seu aniversário, calhou que eu tinha um compromisso social com Viviane. Essa desfeita custou-me alguns dias sem vê-la. Foram dias pavorosos, admito. Implorei para reatarmos o, digamos, romance. Ela concordou, mas disse com todas as letras que queria me ter por mais tempo.
Que poderia eu fazer? Concordei, iniciando então um período de mentiras em casa e no trabalho para conseguir tempo para Bruna. Eram horas esporádicas, às vezes no intervalo para o almoço, outras no final da tarde, com a desculpa de reuniões... Enfim, passei a levar uma vida dupla, uma existência sobressaltada. Estranhamente, Viviane parecia não perceber nada. Felizmente, ela passava a maior parte do tempo cuidado da casa e das crianças ou trabalhando no computador. Para mim, estes trabalhos de digitação que ela começara a fazer em casa caíram do céu, já que a mantinham ocupada e de certa forma distante. Dediquei-me ainda mais a Bruna. Eram presentes, mimos, agrados, horas fortuitas em diversos motéis, saídas cada vez mais ousadas para barzinhos... Sim, não era mais como se fôssemos meros amantes. Eram como se estivéssemos namorando. Conversávamos longamente sobre o passado, sobre como poderia ter sido a nossa vida se tivéssemos ficado juntos. Comecei a retornar para casa para vez mais tarde, as vezes Viviane estava trabalhando no computador, outras vezes já estava dormindo... Acostumado a ser fiel e caseiro, sentia a consciência amargar.
Por fim, aconteceu o que era previsível. Com sua habitual personalidade forte, Bruna jogou-me contra a parede: estava apaixonada por mim, disse, e queria ficar comigo de vez, sem subterfúgios, sem escapadas. Enfim, queria um relacionamento. Ou então, o rompimento. Tentei contra-argumentar, mas ela se manteve irredutível. E queria a resposta rapidamente.
No caminho para casa, após tal conversa, percebi que, com o auxilio do Orkut, eu havia exumado um cadáver, para usar de uma expressão algo grosseira, mas que se aplicava exatamente ao que estava se passando comigo. Minha vida estava quieta, tranqüila, até que eu resgatara do passado algo que estava morto e enterrado, mas que mantinha imenso potencial de sedução.
Confuso, percebi que não sabia o que queria. Evidentemente, não pensava em terminar um casamento sólido, com filhos e segurança... mas por outro lado, não imaginava mais a minha vida com Bruna. Embora não fosse hábito meu, pensei que uns drinques me fariam raciocinar melhor. Enfurnei-me em um bar decadente na Praia do Meio e bebi o suficiente para embaralhar ainda mais minhas idéias. Por fim, não sabia mais o que queria.
Ao entrar no carro, para voltar para casa, pensei em contar tudo a Viviane e esperar pelo pior. Afinal, ela terminando o casamento eu estaria livre para ficar com Bruna. No meio do caminho raciocinei que seria uma besteira por fim a um casamento de tantos anos por causa de uma paixão... E se eu conseguisse protelar a situação com Bruna? Pouco provável. Eu conhecia seu poder de decisão. Se eu não concordasse com seus termos o mais provável é que ela me esquecesse novamente e fosse à procura de um novo amor, com grandes chances de encontrá-lo rapidamente.
Em suma, não sabia o que fazer. Apenas acreditava que não queria – ou não podia – mais viver sem Bruna. Chegando em casa, abri a porta da sala com todo o peso do mundo nas minhas costas. Minha esposa não merecia isso, pensei. Ao entrar em casa, todavia, tive uma surpresa. Viviane estava sentada no sofá, usando um vestido preto bastante curto, com um copo de uísque na mão direita. Um cigarro aceso crepitava em um cinzeiro ao seu lado. Ela reparou em minha expressão surpresa, afinal, Viviane nem bebia uísque nem fumava, mas não sorriu. Ela descobriu tudo sobre Bruna, pensei. O que deveria fazer? Confessar e pedir perdão? Negar?
- Precisamos conversar... – murmurou, com um fiapo de voz na garganta.
Sim, ela descobriu tudo, concluí. Derrotado, sentei-me no sofá á sua frente. Percebi então que não queria perde-la e decidi lutar com todas as forças para não perde-la por causa de minha infidelidade.
- Pode falar... – respondi. Ela bebeu do uísque, respirou fundo e disparou: - Nos últimos tempos temos andado distantes um do outro. Talvez você esteja trabalhando demais, talvez tenha uma amante, não sei...Mas isso não vem ao caso. O fato é que há alguns meses eu percebi que a vida que eu estava vivendo não era o que eu queria, não me satisfazia mais como antes, se é que algum dia eu me satisfiz com ela. Não estou reclamando de você....sempre te achei um ótimo marido, um ótimo pai, não tenho queixas quanto a você...o problema sou eu mesma. E justamente quando eu estava pensando no que deveria fazer da minha vida reencontrei em um bate papo na Internet um antigo namorado, o André. Você se lembra que eu já falei dele, não? Namoramos uns dois anos antes que eu te conhecesse. Eu era louca por ele, ou pelo menos achava que era. Eu não era mais virgem, mas tampouco sabia o que era prazer. Foi com ele que eu descobri tudo que se poderia fazer na cama...enfim, ele me ensinou muitas coisas. Um dia ele me pediu em noivado, falou em casamento. Como me sentia muito nova para casar, recusei, mas no fundo sentia vontade de dividir uma vida com aquele homem um pouco mais velho que eu, ousado, que tanto falava em viagens e aventuras. Meses após minha recusa, ele foi morar na Austrália. Deduzi que a partir dali ele iria correr pelo mundo e emocionalmente desisti dele. Comecei a namorar Rubinho, um rapaz que estudava no cursinho comigo, ciumento e imaturo como poucos e meses depois conheci você, que me parecia a perfeição: equilibrado, seguro, sem excessos, me apaixonei por você e também por... mas era uma paixão contida, segura, que até me faz bem, mas não me completa por inteiro...aí em um bate papo na Internet, numa noite dessas, eis que reencontro André em uma sala de bate papo...começamos a nos teclar, falamos sobre a vida, ele falou das viagens que fizera e de como continuava procurando algo mais...enfim, não tardou que trocássemos telefones e nos encontrássemos. Mas, não pense mal de mim, querido, eu estava decida apenas a encontrá-lo como amigo. O problema é que a situação saiu do meu controle. Ficamos juntos, relembramos o passado e o fato, meu querido, é que descobri que estou apaixonada por ele... Acho que eu e você somos maduros o suficiente para negociamos uma separação tranqüila e amigável... Por que está fazendo essa cara? Não fique assim, meu amor, eu só estou dizendo que quero morar e viver com André... Tenho certeza que você vai me compreender...
Claro que eu compreendera. Viviane também exumara um maldito cadáver. Deveríamos ter deixado os mortos sepultados, mas, eis que agora era tarde demais. Sorri, passei a mão suavemente em seus cabelos e fui para o quarto arrumar minhas malas.