Cefas CarvalhoAcordou cedo, antes mesmo de o sol nascer por completo, colocou a mochila nas costas e saiu para a mata, com o objetivo de capturar mafagafos. Pássaro arisco, de vôo curto, mas muita agilidade e percepção aguda do perigo, o mafagafo desafiava caçadores e pesquisadores. A tal ponto que muita gente acredita que ele não passa de uma lenda infantil, um mero trava-língua.
Num ninho de mafagafos/ tinha sete mafagafinhos/quem os desmafagafizar/bom desmafagafizador será... Quanto a ele, não era nem caçador nem pesquisador. Era um obdecado. Tinha como missão desmafagafizar um mafagafo. Sabia como proceder e tinha, na mochila, os apetrechos necessários para tal. De maneira que saiu confiante em sua empreitada. Enquanto andava, riu baixinho lembrando-se das lendas que cercevam o mafagafo. Incrível que milhões de pessoas não soubessem de sua existência. Acaso seriam o ornitorrinco, o kiwi e o celacanto animais igualmente imaginários? Inclusive, o mito dos mafagafos denotava falta de leitura, desconhecimento mesmo, pensava ele. Tanto Sérgio Buarque de Hollanda como Gilberto Freyre citaram – embora de passagem, reconheça-se – o mafagafo em alguns dos seus escritos (os menos célebres, também era verdade), ele havia lido. Câmara Cascudo cita os mafagafos em seu livro Folclore no Brasil (mas não na 1ª edição pelo Fundo de Cultura, Rio, 1967, mas, sim, em uma reedição revisada de 1976, pela obscura editora Pegasus, onde os mafagafos são citados no capítulo 22, lembrava ele). Também recordou a primeira vez que saíra pelas matas sem fim para caçar mafagafos, anos antes, pouco depois que a esposa o abandonara. A partir daí, não obstante as agruras e surpresas da vida, dedicara-se a pegar mafagafos para os desmafagafizar. Naquela manhã estava disposto a realizar a maior caçada de mafagafos da sua vida. Procuraria não os mais comuns, de coloração laranja, mas os raros, de coloração acinzentada e bico curvo. Horas após percorrer a mata, que lhe parecia labiríntica, circular, achou uma árvore com ninhos nos galhos mais altos que pareciam ser de mafagafos. Tentou subir na árvore, mas o braço machucado não permitiu que o fizesse. Tão perto do ninho de mafagafos e não sabia como subir até o cume da árvore. Observou, próximo à árvore, um machado, milagrosamente esquecido na mata. Não pensou duas vezes e, com o instrumento nas mãos – mesmo com a dor no braço – iniciou a derrubada da árvore a fim que o ninho dos pássaros caísse ao chão. De súbito. Quando efetuava o corte do tronco, mãos fortes o seguraram por trás. Tentou desvencilhar-se, mas, sentiu uma picada no braço e em seguida, uma dormência seguida de sono, sensação já experimentada tantas outras meses. Descordado, foi conduzido para sua cama no quarto 14 no sanatório municipal. E o ninho de pardais continuou firme entre os galhos da mangueira.
3 comentários:
Estranho. podia ser mais longo.
Pois agora. Adorei.
Pois agora. Adorei.
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